Opinião

O Cisne Verde e as oportunidades para a energia renovável no Brasil

Nos 50 anos do Fórum Econômico Mundial, o meio ambiente dominou a pauta e os líderes globais sinalizaram a necessidade de ações diante dos eventos do Cisne Verde

Por Rachel Andalaft

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No início de todos os anos, as atenções se voltam para Davos, onde delegações compostas por presidentes, acadêmicos e membros da comunidade financeira internacional se encontram para debater sobre os principais desafios da atualidade.

Enquanto no ano passado destacou-se o apetite de investimento estrangeiro direto no Brasil, este ano o meio-ambiente dominou a pauta. Em especial, uma nova categoria de risco emergiu dentre os pontos preponderantes da agenda: os eventos denominados Green Swan, em uma alusão ao “cisne negro” de Nassim Taleb, que se refere aos eventos improváveis e de grande magnitude de ordem ambiental.  Ao contrário do que se pode imaginar, a pauta do Cisne Verde não foi alavancada pelos ativistas, como Greta Thunberg, mas pelo próprio Banco para Compensações Internacionais (BIS), uma espécie de banco central dos bancos centrais. 

Cisne Verde

Nos últimos 40 anos, o número de ocorrências climáticas adversas quadruplicou, num momento em que a indústria de seguros se encontra cada vez menos apta para cobrir as grandes perdas causadas por esses eventos.  

Isso por si só exige urgência na implementação de políticas públicas.  A Comissão Europeia aproveitou o evento para dar o seu recado: se os países poluidores ao redor do mundo não adotarem medidas para a precificação de suas emissões de carbono, serão taxados com um imposto equivalente ao negociarem os seus produtos com o continente europeu.  

Ao contrário dos EUA, a Comissão está levando o assunto a sério ao se amparar nas regras da Organização Mundial do Comércio (OMC) para desenvolver tal iniciativa. Até o Reino Unido, que está se desvencilhando das amarras impostas por Bruxelas, sede da União Europeia, defende o imposto sobre o carbono.

Na ordem do dia

Percebe-se então que a política do máximo retorno financeiro para os acionistas já não é mais praticável sem contabilizar danos ambientais sistêmicos.  Isso se aplica sobretudo àqueles investidores institucionais, de perfil de risco conservador e perspectiva de longo prazo, representado pelos fundos de pensão e pelos fundos de investimento.

Esses agentes se adaptam à nova ordem. Percebem que, ao se “esticar demais a corda”, os resultados são nefastos como comprovam os vários litígios, desastres ambientais e danos de imagem que geram valores astronômicos em indenizações e reparações.

Diante desse contexto, o que pode ser dito em relação ao potencial das energias renováveis no Brasil?

Capital privado

É fato que governos alinhados a políticas ambientais progressistas são mais eficientes na captação de capital, tanto para projetos de adaptação como de resiliência.  Por outro lado, o Brasil se beneficia de uma reforma econômica importante, que reduz substancialmente o risco-país e facilita a entra de capital.

Hoje, o agente indutor do crescimento é, sem dúvida, o capital privado, já ciente das vantagens  da abordagem ESG (meio-ambiente, sociedade e governança) nos negócios e que tem se beneficiado de outro elemento: os juros bancários.

Crédito bancário

Independentemente do ritmo de crescimento da economia, existe um esforço dentro do próprio Banco Central brasileiro para eliminar tudo o que possa trazer ineficiências ao mercado de crédito, a exemplo das linhas de juros subsidiados.

Deste modo, a redução da participação do Estado na atividade econômica reduz os juros de mercado e viabiliza novos projetos de energias renováveis.  

Iniciativas adicionais, como a autorização para que fintechs explorem determinados nichos do sistema bancário, vêm somar ao mercado que preencherá o espaço antes dominado pelo BNDES e pelos demais bancos públicos. É difícil superestimar os benefícios diretos ao mercado de capitais do país.   

Fundos de Investimento em Participações (FIPs)

Os FIPs já representam uma expressiva parcela dos investidores em energias renováveis, conforme demonstram os registros de fundos na Comissão de Valores Mobiliários (CVM).  

A seleção dos empreendimentos que fazem parte da carteira é bastante criteriosa, sendo alocados aos FIPs preferencialmente quando se tornam operacionais.  Entretanto, esses fundos apresentam possibilidades diversas e dada a flexibilidade dessa estrutura, possibilita também a participação em empresas desenvolvedoras de projetos.

Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs)

Dado que o ambiente de juros baixos vai prevalecer por mais algum tempo, outros modelos estão saindo do papel. É o caso dos FIDCs que estruturam não uma carteira de projetos mas uma carteira pulverizada de financiamentos. É nisso que algumas gestoras de recursos têm trabalhando, direcionando recursos tanto para a locação (para pessoas jurídicas) como para a aquisição (para pessoas físicas) de painéis solares.

O conceito apoia-se em uma combinação de melhores práticas internacionais de microfinanciamento e financiamento non-recourse : quem instala o equipamento no teto de sua casa usa o valor referente ao desconto na tarifa fio para pagar pelo equipamento nos primeiros cinco anos, se beneficiando dos 20 anos restantes da vida útil para obter o ganho econômico.

Considerando-se todos esses aspectos, chega-se ao ponto principal: a energia solar deterá uma parcela cada vez maior na oferta de energia no mundo.  Os números no Brasil reforçam essa tendência. No leilão de energia nova (A-4), que ocorrerá em maio, mais da metade ofertada (55%) é de fonte solar (794 projetos), somando os nada desprezíveis 28.667 MW de capacidade.

Cabe ao mercado brasileiro, maior beneficiado de uma política econômica acertada, aprimorar suas práticas de captação de investidores e colher os frutos de um mercado de capital mais fluido e melhor estruturado. 

* Rachel Andalaft é sócia-fundadora da REA Consult e gestora junto a investidores institucionais

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